Diários de ônibus, trens e até caminhão...

A ideia de um blog surgiu da intenção de mostrar meu Diário de Bordo a todos os amigos e da impossibilidade de fazê-lo com a rapidez que eu gostaria. Vai ele agora entrar na rede!

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Local: Divinópolis, MG, Brazil

17.10.05

Dia 8 – sexta-feira 15/07


- Deserto de Atacama (dia 2) -

Acordamos depois de uma boa noite de sono e seguimos pro meio do deserto (se é que já não estávamos lá). Rumamos novamente pra um vulcão e, depois de muito tempo, ele cresceu na nossa frente e pegamos uma “estrada” – que na verdade são marcas de carro – que o ladeavam. No início desse caminho, o motorista pára o carro sem um motivo aparente. Todos nos olhamos com cara de interrogação e ele de repente aponta pro capô, ao lado direito: saía uma fumaça preta de dentro do motor. Descemos pra tirar foto do carro enguiçado no deserto com o vulcão no plano de fundo. Estava muito frio, mas o vento estava a favor da direção do carro e não resfriava o motor, que fazia um esforço enorme pra andar sobre pedras. O motorista pegou parte do nosso suprimento de água potável – que já não era como combinado – e matou a sede do radiador. Seguimos viagem e só eu tive coragem de perguntar quais as condições do nosso veículo. Ele garantiu, sem mudar a expressão, que estava bem e parecia nem se importar muito com a situação – já devia estar acostumado, pensei. A partir daí, ele iniciou uma espécie de tique que não terminaria (se é que ainda não terminou) até descermos daquele carro pra chegar na fronteira com o Chile: o carro tinha um paninho cobrindo o painel contra o sol cujas franjinhas tapavam também parte das informações contidas nele e o “tique” do motorista era, sem exagero, de 5 em 5 segundos, até o final da viagem no dia seguinte (repito: de 5 em 5 segundos), levantar as tais franjinhas do pano pra olhar o nível de aquecimento do motor. Por mais que eu tentasse ignorar e olhar pela janela a incrível paisagem do deserto, onde congelaríamos se o carro estragasse, via pelo canto dos olhos a interminável seqüência de movimentos de desprender os olhos da estrada pra levantar o paninho e conferir o nível de aquecimento do motor... Dava nos nervos! Até que chegamos num trecho em que havia uma pequena lagoa e o motorista parou pra abastecer a garrafa de um litro que tinha acabado de esvaziar no radiador. Todos de dentro do carro ficamos olhando aquilo um tanto preocupados. Nisso, vimos o motorista pisar na lagoa e não afundar nem molhar o pé. Volta ele com a garrafa vazia enquanto todos correm pra lagoa pra atirar pedras e tirar fotos. Ele disse simplesmente: Está congelada! Não podíamos acreditar, em plenas 11h da manhã, aquela lagoinha estava completamente congelada. Dois dos brasileiros chegaram a jogar uma pedra nela que rolou como se estivesse no cimento. Seguimos viagem e o único que não sentia frio era o motorista, com seu tique interminável. Passamos muito chão e chegamos ao Mirante do vulcão (aquele ao lado do qual o carro quase nos deixou), onde fizemos uma parada pra fotos. Um amontoado de pedras enormes, tudo sempre coberto de poeira e um vento inacreditável que nos desequilibrava e aumentava ainda mais o frio. Voltamos pro carro pra mais chão e finalmente chegamos famintos à primeira de várias lagunas a visitar naquele dia. Não sabíamos ainda, mas foi a mais impressionante de todas. Uma mistura de cores inacreditável, nevados ao redor e vários flamingos e gaivotas voando e nadando naquela água gelada. Ali almoçamos na presença de outros carros com vários turistas – como eu disse na ocasião, foi o melhor pior almoço da minha vida: arroz colorido, cebola, tomate e pedacinhos de atum formando um mexido, tudo isso, depois de não mais de 2 segundos no prato, já estava absolutamente gelado. A fome é realmente o melhor tempero. Até me arrisquei num suco de pêssego de caixinha – inacreditável do que é capaz um ser humano com fome...

Dali saímos pra conhecer as outras lagunas com seus flamingos, passamos por um lugar com pedras cuspidas por vulcões de formas muito estranhas – sempre com o tique do motorista e algumas paradas pro pobre do carro beber sua agüinha – até chegarmos à famigerada Laguna Colorada, onde havia um hotel de frente e o vulcão Licancabur atrás – nosso abrigo pra noite. Não era tão bonita quanto esperávamos e tínhamos visto na internet, talvez pela época do ano. Mas o que não esperávamos era o frio que fazia ali – chegamos às 18h e o termômetro marcava -15º! O Uans e eu ainda nos aventuramos a uma caminhada pra ver a lagoa de perto, mas voltamos bem rápido porque já escurecia.

Devido à completa falta de higiene, não havia a menor condição de usar o banheiro pra qualquer coisa quanto mais tomar banho, mas como nos haviam dito que havia banho com água quente, reclamamos com nosso motorista e ele respondeu que ali era impossível, uma pessoa que se arriscasse congelaria na hora. Não havia água nem pra escovar os dentes, mas, também, eu não confiaria na água mais cristalina que saísse por aquela torneira. Nos conformamos com aquilo, escolhemos nossas camas num quarto só pros 5, jantamos às 20h e não havia como sair do hotel pra conhecer o vilarejo. O vento era fortíssimo e o frio era descomunal. Os europeus que ficaram no quarto ao lado passavam pelo corredor sempre reclamando do frio – nunca achei que ouviria isso de europeus... Depois do jantar fomos dormir porque era a única maneira de aquecer o corpo. Cada um com todas as suas roupas, seu saco de dormir e mais os cobertores do hotel (dois dos brasileiros colocaram um dos cobertores dentro do saco de dormir). Literalmente apagamos de sono.